Americana, 147 anos
Americana chega a 147 anos com novos desafios
LIBERAL questionou profissionais de diversas áreas para mapear os principais desafios de Americana nos próximos anos
Por Isabella Holouka
27 de agosto de 2022, às 08h27
Link da matéria: https://dev.liberal.com.br/cidades/americana/americana-chega-a-147-anos-com-novos-desafios-1821764/
Um convite para a superação. A fim de mapear os maiores desafios que Americana enfrenta nos próximos anos, o LIBERAL questionou profissionais de diversas áreas que apontam situações difíceis, mas de necessária resolução. São questões relacionadas ao trânsito, infraestrutura, meio ambiente, saúde e serviço social, educação, emprego, indústria, cultura, esporte e segurança pública.
TRÂNSITO. A mobilidade urbana é um grande desafio para Americana, opina Antonio Carlos Sacilotto, engenheiro civil e professor universitário, vereador na cidade entre 2001 e 2016. “Nosso município tem uma extensão territorial pequena, uma população de 244 mil habitantes, com mais de 180 mil veículos cadastrados no município, sendo 150 mil carros, caminhões e ônibus, mais 35 mil motos, somado aos veículos dos municípios vizinhos que por aqui circulam”, lembrou.

O trânsito tem fatores agravantes. São duas rodovias cortando o município, determinando a necessidade de construção de viadutos, mais dois obstáculos, o Rio Quilombo e a ferrovia, que correm paralelos. A via Anhanguera separa a região leste (bairros Antônio Zanaga e praias dos Namorados e Azul) da região central, e a Rodovia Luiz de Queiroz separa a região sul (bairros Parque Novo Mundo e Terramérica) da região central.
“Na Via Anhanguera, a necessidade de construir dois viadutos sobre a rodovia, no prolongamento das Avenidas Tomáz Fortunato e Santino Faraone. Na Luiz de Queiroz, a necessidade de uma passagem ligando o Bairro Terramérica ao Jardim Glória, dando vazão aos veículos para a área central”, apontou Sacilotto, lembrando que as obras sob a Anhanguera estão previstas em um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) entre MP (Ministério Público) e Prefeitura, e que as obras sob a Luiz de Queiroz já foram solicitadas pelo Prefeito Chico Sardelli ao Governo do Estado.
INFRAESTRUTURA. O adensamento populacional é a principal preocupação de Beatriz Bars Nakamura, arquiteta e presidente da Ambrata (Associação dos Moradores do Jardim Brasília e Terramérica). Segundo ela, Americana tem o desafio de prover, nos próximos anos, a infraestrutura necessária naquela região, tanto para quem já mora nos bairros, como para quem está chegando.
“Ainda lutamos para conseguir espaços públicos, calçadas e equipamentos de lazer nas áreas públicas, e logo vamos precisar de escolas, de posto de saúde, que hoje em dia usamos no Jardim Ipiranga ou Vila Galo”, detalhou Beatriz. Para ela, é necessário pensar na “cidade do futuro”, mais sustentável e focada na qualidade de vida das pessoas.
Diretor presidente da subseção de Americana da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Melford Vaughn Neto lembra que Americana tem diversos desafios, principalmente nas áreas de educação, saúde, meio ambiente, mobilidade e segurança.
Um deles é oferecer internet pública de qualidade, com pontos de wi-fi em praças. “O município tem que trabalhar e proporcionar isso para todos, pois há uma série de desdobramentos na educação, até na saúde e na segurança”, disse.
MEIO AMBIENTE. Abastecimento público e esgoto, regularização fundiária urbana e despoluição da Represa do Salto Grande são desafios apontados pelo promotor de justiça Ivan Carneiro Castanheiro, do Gaema PCJ-Piracicaba (Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente), para que Americana possa se desenvolver de uma maneira sustentável e conciliar os aspectos econômico e ambiental.
Ele lembra a necessidade de substituição da rede de distribuição de água, que já tem vida útil vencida. O problema aumenta as perdas no sistema, o que encarece os custos para os consumidores e significa um desperdício na exploração do recurso natural. “Americana é uma das piores cidades em tratamento de esgoto na bacia inteira. Tem um nível de eficiência de 50%, quando deveria ter 80%, e ainda assim, algumas regiões ainda não estão com essa coleta total, ainda tem lançamento in natura, um problema sério” acrescentou.
O promotor cita a região da Gruta Dainese, onde está a favela do Zincão, como um ponto crítico em relação à falta de coleta de esgoto. Zincão e Monte Verde também são citados quando o assunto é a necessidade de regularização fundiária urbana – o que ele destaca ser um desafio em todo o território nacional.
“Não se trata apenas de uma regularização de papel, a lei exige uma infraestrutura essencial, água, esgoto, iluminação pública, captação de águas pluviais para evitar riscos de enchentes, erosão e inundação”, explicou. Por outro lado, o promotor afirma que a regularização traria desenvolvimento, segurança jurídica e arrecadação para o município.
O promotor também citou a Represa do Salto Grande. “O grande desafio de Americana na questão da Represa de Salto Grande é, além de fazer sua tarefa de casa, tratar todo o esgoto das chácaras e condomínios da região, participar de uma articulação forte junto à RMC [Região Z Z Metropolitana de Campinas]”, apontou Castanheiro.
O esgotamento sanitário sem dúvida é um dos grandes desafios para Americana, segundo o diretor geral da Ares-PCJ (Agência Reguladora dos Serviços de Saneamento das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí), Dalto Favero Brochi.
“Atualmente, o município está composto de três estações de tratamento de esgotos (ETE Carioba, ETE Praia Azul e ETE Gruta-Balsa), mas necessita melhorar, e muito, a eficiência no tratamento desses efluentes, no curto e médio prazo”, falou.
SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL. “Eu penso que Americana tem uma qualidade de medicina muito boa, de excelentes profissionais. Mas fazer isso chegar até a saúde pública realmente é um grande desafio. As dificuldades são bastante complicadas em nível administrativo”, opina o dr Renato Monteiro, presidente da AMA (Associação Médica de Americana).
Para ele, a cidade possui uma infraestrutura para a saúde satisfatória, tanto na esfera pública, através do Hospital Municipal e das UBSs (Unidades Básicas de Saúde), quanto na privada. Porém, especialmente na esfera pública, faltam profissionais.
Em Americana, diversas entidades sociais têm passado por dificuldades por excesso de procura. Lidar com este cenário, em que a demanda é muito maior do que os recursos, é um desafio para a cidade, segundo Roberto Cullen Dellapiazza, presidente da APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) Americana.
“Só temos dois abrigos para crianças e adolescentes, eles estão sempre lotados e com fila de espera. Americana também precisa ampliar o serviço de abrigo para idosos, porque a demanda do município é muito grande. E o atendimento às pessoas de rua também é um grande desafio para a gente”, detalhou.
EDUCAÇÃO. “Americana pode e deve recuperar o posto de vanguarda”, opina Adriana de Abreu, diretora do Sinpra (Sindicato dos Professores de Americana) e professora no CIEP (Centro Integrado de Educação Pública) “Prof.ª Maria Nilde Mascellani”, no bairro Jaguari.
A professora lembra que todas as cidades do Brasil e do mundo precisam lidar com os danos causados pela pandemia e argumenta que Americana sofreu um sucateamento, através de demissões de professores (em 2015) e falta de investimento. “Hoje nós não temos um quadro de pessoal suficiente para desenvolver o trabalho que era feito nos Cieps. Para mim, o maior desafio é fazer concurso”, afirmou.
Luciene Tognetta, pesquisadora do Gepem (Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral), que reúne especialistas da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) observa duas necessidades na educação americanense: uma política pública de formação de professores e o fortalecimento da rede de proteção de crianças e adolescentes.
“O grande investimento que a cidade precisa é uma política pública de formação de professores para as maiores dificuldades que as escolas americanenses, certamente, como as demais escolas deste país, têm enfrentado, as questões de convivência”, opinou Luciene. Neste mês de agosto, a Prefeitura de Americana noticiou a construção de um complexo para formação de professores, no bairro Campo Limpo, conforme noticiou o LIBERAL.
“Sentimos falta de uma articulação intersetorial entre os componentes da rede de proteção. Recebemos queixas de alunos, escolas e pais com crianças ou adolescentes que não são aceitos por terem problemas de comportamento ou estarem em situação de acolhimento, professores que mandam para conselho tutelar problemas que são de ordem da própria escola… Então, como a gente valida e valoriza aquilo que temos de mais importante, a proteção à criança?”, questionou a pesquisadora.
Lembrando que a educação é fundamental para que qualquer cidade se mostre um polo tecnológico e desenvolvido, o diretor da FAM (Faculdade de Americana) Gustavo Azzolini citou como um desafio para a cidade a oferta de cursos profissionalizantes e técnicos que ajudem a população a ingressar em um mercado de trabalho que está cada vez mais tecnológico, competitivo e exigente.
“Se nós conseguirmos capacitar cada vez mais a população, ela estará pronta para o mercado de trabalho. Um mercado de trabalho com novos desafios e mudança constante, com tecnologia. Conseguiremos ter desenvolvimento socioeconômico, novas indústrias, novos empregos, tudo com base na educação”, argumentou.
EMPREGO. Uma tecnologia que reúna a população à procura de emprego e capacitação alinhada ao desejo e a necessidade de quem oferece vagas, mais as oportunidades de trabalho em si, é a sugestão do presidente da Acia (Associação Comercial e Industrial de Americana), Marcelo Fernandes.
“Conseguir ajustar a demanda de mão de obra qualificada, com aquele segmento que precisa. E o desafio é que tem horas que temos cargo, temos cursos, mas não temos a pessoa interessada. Tem horas que temos a pessoa interessada, mas não temos curso. E tem hora que temos a pessoa interessada, temos curso, mas não temos vagas de trabalho. Precisamos encontrar, talvez através da tecnologia, uma maneira de sermos mais assertivos na capacitação, demanda e oferta de emprego”, resumiu o presidente da Acia.
INDÚSTRIA. A adaptação do setor têxtil às práticas do ESG (Environmental, Social and Governance, em inglês) é um grande desafio para a indústria americanense, segundo Leonardo Sant’Ana, presidente do Sinditec (Sindicato das Indústrias de Tecelagem, Fiação, Linhas, Tinturaria, Estamparia e Beneficiamento de Fios e Tecidos de Americana, Nova Odessa, Santa Bárbara d’Oeste e Sumaré).
O termo se refere a critérios que demonstram comprometimento com questões ambientais, sociais e de governança. Na prática, significa a adoção de ações como a redução na emissão de carbono, uso de recursos renováveis e energias alternativas, ao passo em que as empresas também se dedicam a desenvolver os relacionamentos humanos entre colaboradores e comunidade e atuam com transparência, ética e responsabilidade.
De acordo Sant’Ana, os grandes magazines estão aderindo ao ESG e tendem a exigir que os fornecedores façam o mesmo. “Será uma transformação nos negócios, com muitas mudanças nas empresas, e será possível monetizar isso, a empresa vai conseguir vender melhor, com preços melhores, porque será valorizada nesse processo”, apontou.
CULTURA. Ampliar e facilitar o acesso da população à cultura através de uma programação extensa e descentralizada é o desafio apontado por Raphael de Araújo Franco, regente da Banda Marcial e da Orquestra Filarmônica do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) Americana, por onde passam 250 alunos por ano, maioria de Americana.
“Música na praça, justamente para fomentar a cultura nas comunidades, uma vez sabemos que nem todos têm acesso a isso. Devido à pandemia, muitos desses projetos cessaram, e não temos visto. Talvez seja algo que possa ser um desafio, pensando no acesso das pessoas, uma programação mais extensa para atingir esse público”, comentou à reportagem.
O que se vê na cultura americanense se faz presente na maioria das cidades do Brasil, em decorrência do processo cultural em que a valorização e o investimento na área são questionados a todo momento, avalia Carlos Justi, diretor-executivo da associação cultural Fábrica das Artes. Ele acredita que uma política cultural com diretrizes a longo prazo é um desafio para a cidade.
“Eu vejo que a cultura em Americana está em uma situação de letargia, bem paradona, sem movimentação dentro do que pode e dá para ser feito. Z Não existe uma política cultural estabelecida, que dá as diretrizes para o que será feito daqui a 5 ou 10 anos. Uma política pública seria um grande salto, não só para o momento, mas para os próximos anos, com metas para curto, médio e longo prazo, análise do que temos hoje e onde queremos chegar”, explica.
Segundo Justi, um dos maiores problemas na área cultural em Americana é a falta de continuidade de iniciativas de sucesso. “Tínhamos um festival que estava entre os oito maiores de São Paulo e os 20 maiores do Brasil, o Festival de Teatro de Americana, que foi até a 12ª edição, recebendo grupos de outros países, e depois parou. Sem contar a quantidade de projetos que existiam e não existem mais”, lamenta o profissional.
ESPORTE. Criador da Escola de Goleiros, Vander Batistella conta acompanhar o desenvolvimento de Americana desde 1987 e considerar a cidade como sua casa enquanto viveu o futebol em times profissionais. “Sempre percebi que Americana era uma referência em relação ao esporte. O incentivo que dava ao esporte nos anos 1990, e começo dos anos 2000 me chamou muito a atenção. Podemos dizer que, de 15 anos para cá, mais ou menos, sentimos muita falta disso”, comenta.
Vander sugere o desafio de alinhar poder público, empresas da iniciativa privada e a comunidade para manter a estrutura pública – praças de esportes espalhadas pela cidade – e possibilitar que as pessoas possam usufruir dos espaços.
“Para que os alunos sejam beneficiados de uma estrutura de qualidade, além de todo o enfoque no treinamento, no desenvolvimento do ser humano, e na promoção da socialização entre eles”, aponta.
“Eu ainda espero que Americana possa voltar a ser aquela cidade que eu conheci lá atrás, que realmente tinha embutido o esporte na veia. Esperamos que isso aconteça nos próximos anos, a partir do poder público, mas que a população e as empresas também se mobilizem para caminharmos juntos”, destaca.
SEGURANÇA PÚBLICA. Com cerca de 30% da cidade coberta pelo sistema de videomonitoramento da Gama (Guarda Municipal de Americana), o desafio de Americana, para inibir ou melhorar o suporte às forças de segurança diante de crimes, é fazer com que a taxa de cobertura chegue a totalidade, afirma Marco Aurélio da Silva, comandante da corporação. São câmeras em prédios públicos municipais, praças, ecopontos e avenidas, além pontos de entrada e saída da cidade.
“A câmera substitui o patrulhamento com viatura? Não, mas fazendo uma comparação de investimento, o quanto custa um guarda, policial militar ou soldado, treinado e armado, o custo é muito menor. Solucionando todo crime que acontecer, existe uma tendência automática, que já ocorreu em outros municípios, de a criminalidade migrar para outra região, onde haja menos risco de serem pegos praticando o delito”, detalhou Marco.
Questionado sobre o desafio de Americana na área de segurança pública, o tenente-coronel Adriano Daniel, no comando do 19° BPMI (Batalhão da Polícia Militar do Interior), foi taxativo: “Implementação da muralha eletrônica em todas as saídas de Americana”.
Segundo ele, o monitoramento reduz índices criminais, principalmente envolvendo o roubo e o furto de veículos. É uma tecnologia flexível, com funcionamento em nuvem e recursos de monitoramento digital.
“O monitoramento permite aumentar a capacidade de atendimento da PM e da Gama, pois otimiza os recursos financeiros e humanos. A tecnologia auxiliará também no mapeamento de rotas de fuga usadas por criminosos e esclarecimento de diversos crimes”, apontou.
O QUE DIZ O POVO. LIBERAL foi às ruas para saber quais são, aos olhos dos cidadãos, os desafios para uma cidade com mais qualidade de vida e desenvolvimento
Maria Zilda Bernardes de Medeiros
Aposentada, 64 anos | conta usar o
transporte coletivo da cidade com frequência, apesar da demora.
Eu acho que deveria ter mais ônibus nas linhas, mais horários, para não ter que esperar tanto. E também informar os horários, porque você chega no ponto e não sabe, fica esperando uma hora”
Marcelo Quinelato
Saxofonista, 52 anos | opinou que está faltando trabalho para os músicos da cidade e pediu mais programações musicais.
Nós que somos músicos e artistas estamos precisando disso. Está faltando agilizar essa área. Empregar a gente tem vantagem para a população, porque cultura e educação andam juntas”
Antonio Vitor dos Santos
Taxista, 64 anos | sobre o trânsito da cidade, ele disse que algumas “mudanças prejudicam bairros inteiros”, por isso é necessário mais bom senso nas tomadas de decisões.
Saúde, dizem que melhorou bastante. Mas é algo que estava em decadência. É difícil ter um problema, não poder pagar e precisar esperar tanto para ser tratado”