Americana
Estudo de moradora de Americana abre novas hipóteses sobre humanos nas Américas
Paleontóloga participa de pesquisa sobre fósseis que indicam presença humana nas Américas muito antes do que se sabe
Por Gabriel Pitor
23 de julho de 2023, às 08h48 • Última atualização em 24 de julho de 2023, às 09h35
Link da matéria: https://dev.liberal.com.br/cidades/americana/rastros-de-outras-eras-1993104/
As escavações no sítio arqueológico de Santa Elina, no Mato Grosso, realizadas nos anos 1990 e 2000, levaram à descoberta de um adorno, parecido com um pingente, feito de ossos de uma espécie de preguiça gigante. Quase 30 anos depois, o objeto foi estudado pelas paleontólogas Mírian Pacheco e a moradora de Americana Thaís Pansani, ambas da Ufscar (Universidade Federal de São Carlos).
“Parecia que o pingente estava me esperando para ser estudado”, brincou Thaís, em conversa com o LIBERAL. As análises possibilitaram a publicação de um artigo científico na revista especializada britânica Proceedings of the Royal Society B, assinado pelas duas paleontólogas e também por Águeda e Denis Vialou, do Museu Nacional de História Natural de Paris, onde se encontra o objeto. No estudo, duas importantes evidências foram encontradas.

“A primeira é que as deformações e as perfurações nos ossos não ocorreram de forma natural. Foram modificações feitas por humanos. A segunda é que alguns pesquisadores questionavam quando essas perfurações foram realizadas, já que humanos de outros tempos poderiam ter achado esses ossos fossilizados e terem feito o pingente. E nós mostramos que o pingente foi feito na Era do Gelo das Américas”, explicou Thaís. A datação foi obtida por meio de fragmentos de carvão e outros sedimentos.
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O pico da Era do Gelo, nomeado de Último Máximo Glacial, aconteceu nas Américas (inclusive, no território onde hoje se compreende o Brasil) há cerca de 25 mil anos. Isso abre novos debates para arqueólogos e paleontólogos, visto que as pesquisas até então constatavam a chegada de humanos ao território há aproximadamente 15 mil anos.
“É preciso fortalecer as hipóteses de ocupação das Américas, porque Santa Elina não é o único sítio arqueológico. Estamos encontrando evidências de que os humanos estavam aqui durante o pico da Era do Gelo, ou seja, são 10 mil anos antes. A questão é de onde esses humanos vieram e como vieram”, apontou Thaís.
“Outros questionamentos que a descoberta também traz: a interação dos humanos com a mega-fauna, que foi extinta. Preguiças gigantes, grupos de elefantes gigantes, tatus gigantes. Eles foram extintos por força antrópica ou pelas condições climáticas? E esse pingente era usado como adorno, então os seres humanos viam esses objetos como algo importante”, completou.
O próximo passo, segundo Thaís, é pesquisar qual o simbolismo cultural do pingente – se era moda, se configurava algum status ou se identificava um membro de uma tribo. A paleontóloga diz que irá a um congresso em Paris, na França, para conversar com especialistas. Além disso, outros artefatos colhidos em Santa Elina devem ser estudados, bem como novas escavações devem ser realizadas no local.
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RELAÇÃO COM AMERICANA
Natural de Fernandópolis (SP), Thaís se mudou para Americana quando tinha 12 anos por causa do pai, Manoel, que conseguiu um emprego como vendedor de carros. Ela fez na cidade todo o restante do ensino fundamental e médio antes da faculdade, mestrado e doutorado na Ufscar, em Sorocaba.
“Eu me lembro do colegial e do quanto foi importante ter contato com os meus professores, porque a minha paixão pela ciência, pela evolução e pela paleontologia nasceu aos 13 anos. Às vezes, até brinco com a minha mãe: será que se eu não tivesse saído de Fernandópolis, eu teria
sido cientista?”, disse.
Mesmo entre viagens para estudos e congressos, Thaís ainda reside em Americana e vê na cidade um sentimento de lar. “Voltar para cidade é ter minha família e meus amigos, que são minha base, são as pessoas que me aguentaram o tempo todo”.